top of page

O valor de um mercado

  • Foto do escritor: Gazeta Goyazes
    Gazeta Goyazes
  • 5 de ago. de 2024
  • 14 min de leitura

Atualizado: 9 de ago. de 2024

Os sete mercados municipais de Goiânia são pontes entre economia, cultura e saberes, mas precisam de garantias de sobrevivência


Por Geovanna Siqueira, João Vítor Bueno, Mariana Brito Xavier e Natália Eduarda



Ouvir o texto:
Audio cover
O valor de um mercadoMariana Brito Xavier


Os Mercados Municipais, que chegaram a Goiânia na década de 1950, são ambientes caracterizados por sua diversidade de produtos e serviços, além da grande presença da cultura regional. Na capital Goiana, existem sete mercados que contribuem, para além da economia, com a manutenção de valores tradicionais goianos. 


Com potencial para o turismo, movimentam a economia dos bairros, vendem produtos típicos, artesanatos, itens culinários da região e até mesmo produtos eletrônicos. Mas os espaços precisam de revitalização e planejamento estratégico para valorização do comércio local. Assim, nessa reportagem trazemos diferentes aspectos dessa realidade, que o leitor confere a seguir:







Calçada da parte externa do Mercado. À direita, têm-se diversos carros estacionados e à esquerda, lojas abertas e clientes circulando pela calçada
Mercados Municipais se destacam pela diversidade de serviços e visitantes. Mercado Pedro Ludovico Foto: Mariana Brito Xavier

Mais do que cultura, pontos de convivência de um povo


Ouvir o texto:
Audio cover
Mais do que cultura, pontos de convivência de um povoMariana Brito Xavier

“Mas ele [o mercado] mantém a sua tradição. É um local muito bacana para você vir trazer sua família, arrumar seu relógio, cortar seu cabelo, comer um pastel. Aqui, a gente tem uma série de serviços, e fico feliz de estar aqui, porque faz parte da minha história”, diz Rogério Lauria, comerciante do Mercado da Vila Nova há mais de 12 anos,  que já tinha o hábito de frequentar o estabelecimento quando criança.


Construído sobre parte da Praça Boaventura Moreira de Andrade, o terreno onde se edificou o mercado continua sendo área pública. Hoje, permanece como um ambiente tradicional e variado, tanto no comércio gastronômico, quanto em prestação de serviços. 


Enquanto isso, o Mercado Popular da 74 atrai diferentes públicos, devido à variedade de bares, restaurantes e uma programação musical diferente para cada dia da semana, como  também se destaca devido à Feira de Orgânicos que ocorre aos sábados. 


Matheus Henrique, 29 anos, comenta sua motivação para ir à 74: “Acho que o principal é o alimento orgânico que a gente [ele e sua esposa] prefere, do que com agrotóxicos. Então temos essa visão de alimentação mais saudável.” 


Além disso, outro diferencial para eles é o ar amigável do local. Para Paulo Marçal, feirante há mais de 15 anos, isso é muito nítido em sua rotina: “O melhor é que a feira não é só um espaço de comercialização, mas um espaço de convivência, né? Hoje eu saí daqui [sua banca] várias vezes para ir até o final da feira. Mas não conseguia, pois alguém sempre me parava [para conversar].”


Ele reflete, também, sobre o valor cultural da Feira de Orgânicos no Mercado da 74: “Quando eu resgato um milho crioulo, eu tô valorizando esses aspectos culturais e históricos, das pessoas que valorizavam aquilo que foi banido do mercado. Quando esse senhor chega aqui e vê o milho de pipoca, ele chora de emoção porque remete à infância dele, um aspecto da cultura dele. Então, é um respeito à cultura das pessoas.”


O turismo também é um fator fundamental para os mercados municipais, tanto por uma questão econômica, quanto pela valorização cultural da capital. Para Marcos Magalhães, presidente da Associação do Mercado Central, a clientela se diversifica ao longo da semana, com a presença maior de turistas de sexta-feira a domingo. 


Raimunda De Jesus, comerciante do ramo de artesanatos no Mercado Central, argumenta que a cultura goiana atrai muito interesse dos turistas: “A pessoa vem uma vez e é difícil ela não voltar. Dificilmente um cliente de artesanato não volta. Ela sempre traz mais alguém.”


Já para Maria Vanderly, dona da loja Derlys Presentes, o Mercado Municipal Pedro Ludovico não estar na rota de turismo de Goiânia é uma grande perda para o local: “Seria muito interessante se a prefeitura trouxesse atrativos para o Mercado. Quando as pessoas viessem visitar Goiânia, o Pedro Ludovico também estaria nesse hall de visitas.”


Segundo ela, a maior perda dessa clientela se deve, para além da localização pouco favorável, se comparada aos Mercados Central e da 74, devido a uma “descaracterização do mercado”: “O nosso mercado hoje está muito eletrônico. Acho que ao longo do tempo ele foi perdendo aquela coisa de ter várias mercadorias diferentes. No Mercado Central, por exemplo, você vai lá e encontra várias lembrancinhas de Goiânia e de Goiás, e isso nós não temos para oferecer ao público que vem passear.”


Maria Silvia, comerciante aposentada do Mercado Vila Nova, trabalhou no estabelecimento desde a adolescência e conta: “Tudo que a gente tem hoje em dia devemos ao povo de Vila Nova e ao Mercado da Vila Nova”, diz sobre a importância do local no processo de construção da capital goiana. Isso porque foi o segundo Mercado Municipal de Goiânia e se caracterizava como um dos principais locais de abastecimento de produtos alimentícios da cidade.


Ela finaliza relembrando com carinho sua trajetória no bairro e no Mercado: “Eu preferia voltar para a fazenda do que morar na Vila Nova. Hoje, eu sou apaixonada por essa vila, né?”










O papel dos mercados na economia e tradição local


Ouvir o texto:
Audio cover
O papel dos mercados na economia e tradição localNatália Eduarda

O valor dos mercados municipais para a economia é representativo para a grande capital goiana. Por não serem apenas espaços de comércio como os demais mercados, eles se destacam pela tradição que os envolve e as razões que motivam os clientes a procurá-los. Além disso, são um exemplo de reinvenção comercial, permanecendo, assim, vivos no cenário econômico mesmo com o passar do tempo. 


Com razões maiores que a simples busca de mercadoria, os mercados municipais são frequentemente procurados em virtude da sua relevância histórica, que promove a reconexão com a grande Goiânia - o que, no final, se torna mais um fomento econômico.


Já faz três anos que Matheus Henrique de Faria, 29 anos, busca frequentar o Mercado da 74 aos sábados. Ele e sua esposa preferem esse local, pois é lá que encontram produtos que já são mais específicos e únicos. Alimentos orgânicos, a culinária presente e o próprio ambiente do mercado são motivadores que os levam a sair de onde moram até o espaço. 


Para Paulo Marçal, 65, um dos agricultores e comerciantes da Feira de Orgânicos da 74, o grande diferencial é que, por se tratar de algo essencial como a alimentação, não há períodos do ano que sejam significativamente melhores que outros. Isso explica por que Matheus frequenta o ambiente quase semanalmente.


A Feira de Orgânicos, que o cliente explica ser a maior responsável por sua ida todos os sábados ao mercado, começa às 6h e vai até às 10h, se adequando ao funcionamento do próprio mercado, que hoje é reconhecido por seus bares, restaurantes e lanchonetes, que precisam do espaço livre para o período de almoço.


Espaço usado para as mesas no horário de almoço no Mercado da 74. Foto: Natália Eduarda

Flavia, 50; Elizabeth Araujo, 53; e Paulo, 65 anos, são três dos 24 produtores e comerciantes que estão no Mercado do Bairro Popular, conhecido como Mercado da 74 no comércio de orgânicos. Todos já estão no local há muito tempo. Paulo, por exemplo, trabalha na área há mais de 10 anos.


Para Paulo, a importância da feira não é medida somente pela questão comercial. Ele a vê como um espaço essencial para o fortalecimento dos vínculos afetivos e pelo saber ancestral. É, também por isso que ele, Flávia e Elizabeth acreditam que essas são razões pelas quais as pessoas continuam frequentando o local, o qual se torna um espaço cultural e de economia circular. 


Embora haja diversos alimentos existentes, não são todos que o consumidor tem a oportunidade de conhecer. Diante disso, Paulo enxerga na feira e nos alimentos que produz a oportunidade e o direito que as pessoas têm de descobrir e aprender tudo que a natureza pode oferecer. “Toda essa diversidade de alimentos a gente traz para a feira porque as pessoas têm direito de conhecer, né? Senão todo mundo vai comer sempre a mesma coisa.”



Foto de mãos segurando milho criolo, uma qualidade de milho com sementes pretas
“A pipoca do milho preto é muito mais saborosa que a comercializada nos mercados” diz, Paulo Marçal, comerciante da feira de orgânicos da 74. Foto: Natália Eduarda

Um pouco mais longe do centro, já no bairro Vila Nova, trabalha Seu José, relojoeiro do mercado municipal do setor. O comerciante conta que, mesmo com vários centros comerciais pela cidade e a diminuição da movimentação nos mercados de forma geral,  não deixaria de abrir uma loja hoje no recinto por nenhum motivo. Ele justifica dizendo que foi de lá que tirou seu meio de sustento durante determinado momento da vida, e é de lá que ele ainda o tira.


“Existe a procura por produtos específicos que o cliente sabe que só vai achar aqui no mercado”, diz ele enquanto precisou parar diversas vezes para atender sua clientela. Durante a reportagem, foi possível  observar o mesmo acontecendo nos outros mercados, como no Mercado Central e do Bairro Popular. Comerciantes de ambos os locais apresentaram falas semelhantes.



Relojoeiro de costas para a câmera e de frente para uma mesa com diversas peças. Está segurando uma ferramenta
Seu José, relojoeiro, no exercício de sua profissão. Foto: Natália Sezil

Márcio Magalhães Júnior, presidente da associação do Mercado Central, e Dona Raimunda, ex-presidente, destacam que a presença constante de clientes acontece porque ele se encontra próximo ao aeroporto. É também devido a isso que turistas são atraídos, fazendo com que o mercado seja sempre visitado. Além dos vários comerciantes e funcionários que trabalham no local, a associação contratou mais de 10 pessoas para os cuidados e limpeza. 


Mercados como o de Vila Nova, da 74 e Central não se destacam e permanecem existindo na economia goianiense por mero acaso. Seja de modo formal ou informal, geram ocupação, renda e têm potencial - eles promovem o comércio e têm destaque em seu caráter especial que ronda o povo goiano: a gastronomia. 


Para o público que frequenta esses locais únicos da capital, provar os pratos tradicionais é indispensável quando se pensa em visitar o mercado. Leila Diniz, 32 anos, afirma que os clássicos do centro goiano são as Empadas do Mário e do Alberto, e para ela “não existe isso de ir na Rua 3 sem passar por algum dos restaurantes”. 


Marcus Vinícius, dono do Restaurante Alambique e membro da associação de lojistas do Vila Nova, defende que, além dos mercados serem interessantes de se estar, são locais nos quais se pode encontrar comida caseira de qualidade com valores acessíveis. A rica culinária que é oferecida vai da variação de petiscos, pastéis, às famosas empadas e até pratos especiais. 


Pratos brasileiros conhecidos nacionalmente, como feijoada, são encontrados em eventos culturais que os próprios mercados produzem, como é o caso do Mercado da Vila Nova e do Bairro Popular, que diariamente tem programações que começam às 17h. São esses eventos que atraem o público no âmbito cultural, que intensificam a circulação econômica e, mais uma vez, mostram o poder de reinvenção que os comerciantes têm.


Os eventos culturais são uma das várias estratégias que os comerciantes locais buscaram para se movimentar no mercado. A venda de alimentos, vestuários, artesanatos e eletrônicos não é procurada somente para a finalidade de atender às necessidades, mas é um dos atores locais como parte integrante dos processos de desenvolvimento e dinamização da comunidade.


Esses mercados geram empregos. Só no da Vila Nova há mais de 54 famílias trabalhando, fora as pessoas contratadas; uma quantidade maior está presente no da Rua 3, e, com isso, movimentam os recursos e a economia goiana. O espaço que mercados como o de Vila Nova, Central, da 74 ocupam são exemplo da característica única que esses locais oferecem aos moradores e seus comerciante


Tradição X Digital: a tecnologia nos Mercados Municipais


Ouvir o texto:
Audio cover
Tradição X DigitalJoão Vitor Bueno

Uma das principais características dos mercados municipais é a grande variedade de produtos e serviços oferecidos e, desde seu surgimento, os sete mercados goianienses apostaram na diversidade para a ampliação do consumo, atração turística e rememoração da cultura local. As comidas típicas variadas, objetos presenteáveis, produtos naturais, artesanato e vestimentas foram, até certo ponto, as mercadorias base para o que se evoca quando pensamos em um mercado municipal.


Desde o ano de 2020, com a pandemia e os impactos da tecnologia na maneira de se consumir, alguns lojistas se viram obrigados a adaptar seus negócios, trazendo mais visibilidade e demanda para seus produtos. Maria Vanderly, proprietária e lojista há mais de 25 anos de um estabelecimento no Mercado Municipal do Pedro Ludovico, destacou que a venda dos produtos eletrônicos descaracterizou o mercado e o afastou dos demais de Goiânia.



Imagem do corredor interno do Mercado Pedro Ludovico. O local está decorado com bandeirolas coloridas. A esquerda têm-se lojas abertas e à direta, fechadas. Há clientes sentados em bancos na parte central do corredor e, também, circulando próximo às lojas
Mercado Municipal do Setor Pedro Ludovico. Foto: Mariana Brito Xavier

O Mercado Pedro Ludovico, que passou por uma reforma no ano de 2008, é o segundo na ordem do processo de revitalização e reforma estabelecido pela Prefeitura de Goiânia. Ele conta com diversas lojas de tecnologia e artigos eletrônicos na sua parte interna e, do lado de fora, barbearias, lanchonetes e produtos naturais.


Os lojistas, que antes ofereciam seus produtos para serem consumidos somente nas lojas físicas, passaram a disponibilizar serviços online e de entrega para diversas regiões, alguns até para o país todo.  


É o caso de Rogério dos Santos, dono da Banca Vila Nova, que afirma que, por necessidade de um mercado globalizado e digital, adaptou seu comércio, mas manteve a tradição da banca. 


“A gente se inovou, não ficamos parados no tempo. Acredito que somos a única banca em Goiânia que trabalha com miniaturas colecionáveis na escala 1/43. A gente não vende só a miniatura, a gente vende a história embutida em cada uma delas, e isso deu muita visibilidade para a banca. Hoje enviamos miniaturas para o Brasil inteiro.”


Ouvir o texto:







Revitalização: comerciantes aguardam início das obras


Ouvir o texto:
Audio cover
RevitalizaçãoMariana Brito Xavier

A Prefeitura de Goiânia, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Criativo (SEDEC), anunciou, em abril deste ano, o projeto de revitalização dos mercados municipais da capital goiana. 


As obras estavam previstas para serem iniciadas na primeira quinzena de maio. No entanto, até agora não houve movimentações. Segundo Divina Pereira dos Santos, gerente de Mercados e Camelódromos Municipais de Goiânia, o atraso se deve ao trâmite das licitações e dos projetos específicos de cada local. “Para cada departamento de mercado tem um projeto diferente. Nós não podemos pegar um projeto do Mercado Vila Nova e levar para o Mercado de Campinas”.


As obras, de acordo com a gerente da pasta, serão focadas nas necessidades particulares de cada infraestrutura, seja em questão de infiltrações, pinturas ou conserto de coberturas. “Não vai ser um fazer de conta. É para ficar na história”, garante.



No Mercado Vila Nova, muitas lojas do interior do espaço são usadas como depósitos ou foram abandonadas. Crédito: Fernanda Queiroz



O primeiro mercado a ser revitalizado será o do bairro Vila Nova, que funciona desde 1957. Segundo Marcus Vinícius, presidente da Associação de Lojistas desse local, a reforma do espaço não é um benefício apenas para os comerciantes: “A gente acredita piamente que vai acontecer [a reforma], por uma questão de necessidade. E não é só para nós. É para a comunidade, para servir à comunidade.”


Para Maria Vanderly, comerciante do Mercado Pedro Ludovico há 25 anos, as principais demandas são referentes à reforma do telhado: “As chuvas de setembro e outubro logo, logo estão aí, então o que a gente mais espera de antemão é isso: que a prefeitura não se esqueça de nós.” 









O que motiva as pessoas a frequentar os mercados?


Ouvir o texto:
Audio cover
O que motiva as pessoas a frequentarem os mercados?Mariana Brito Xavier

Os mercados municipais, por serem antigos e terem acompanhado grande parte do crescimento de Goiânia, têm uma clientela bastante habitual - sejam idosos que já tinham o costume de ir ao mercado municipal mais próximo, ou adultos e jovens que iam ao mercado com seus pais e criaram o hábito. 


Além disso, a maioria dos mercados municipais continuam com os mesmos comerciantes ou com a família de um antigo comerciante que iniciou a loja. Situações assim deram confiança e familiaridade à clientela.  


“Quem vem à feira gosta de vir por convivência, [o cliente] gosta de conversar, de estar aqui”, conta Flávia, dona de uma das bancas de frutas e verduras orgânicas do Mercado da 74, sobre a preferência da clientela de ir ao local.


Para Flávia, as pessoas que têm uma rotina mais pesada optam pelo delivery. Mas, se todos tivessem tempo, ou houvesse mais lojas e feiras de orgânicos pela cidade, os clientes gostariam muito mais de ir até o local e escolher por si mesmos. 







“Eu não vendo carros, vendo histórias”

Jornaleiro do Mercado Vila Nova conta sobre reinvenção da banca de revistas


“Antes de eu vir para o Mercado da Vila Nova, eu passava como consumidor, desde os anos 1980”.


Ouvir o texto:
Audio cover
Eu não vendo carros, vendo históriasMariana Brito Xavier

Foto de Rogério e sua esposa com a pintura da banca em frente a avenida. Crédito: Arquivo pessoal

Jornaleiro há 24 anos, Rogério Lauria conheceu a banca em que hoje trabalha, ainda criança. Começou sua carreira com impressos em um outro local, mas, após 12 anos, recebeu a oportunidade de adquirir sua própria banca ali no Mercado: “Parece que é o cosmos que estava me colocando aqui.”


Ainda em 2016, ele percebeu uma queda na venda dos impressos e resolveu mesclar os produtos. Esse processo se intensificou com a pandemia da Covid-19, que forçou as pessoas a aprenderem a comprar na palma da mão: “Uma coisa que eu já mexia aqui na época que eram as miniaturas. Então eu vi um mercado, um nicho a ser explorado. Quando fechou tudo, falei: ‘Gente, tenho que sair da zona de conforto’. 


Com isso, passou a trabalhar pela internet e conquistou uma clientela que continua fiel ainda hoje, não só em Goiânia, mas no país inteiro. 


Ô loco meu!


Uma pessoa que quase ninguém sabe que foi importante para o meu tipo de trabalho…  Se eu encontrasse ele na rua, daria um cheiro: o Faustão.”


Rogério explica que, já que durante a pandemia os programas televisivos estavam sendo gravados nas casas dos apresentadores, Faustão fazia seu programa em uma sala com sua coleção de miniaturas automotivas. “O pessoal perguntava muito para ele, ‘Faustão, essa coleção sua é para venda? E ele dizia, ‘Não, essa coleção é minha!’ ” 


Faustão mostrando sua coleção de miniaturas de carros. Crédito: Globo Play

Assim, a curiosidade que o apresentador de TV despertou no público que o assistia, abriu portas para uma nova clientela: pessoas entediadas em casa, que se interessaram em pesquisar e adquirir coleções de miniaturas automotivas, o que motivou o jornaleiro a investir ainda mais nesse ramo. 


“Não entendo de carros, mas gosto de histórias"


“Hoje eu vendo pro país todo, e uma coisa que eu descobri é que eu não entendo muito de carros, mas eu gosto de histórias.” Com isso, Rogério contou que a forma como conquistou uma clientela tão diversa e extensa foi, muitas vezes, por não saber mais sobre carros. De acordo com ele, o período de pesquisas, entrar em grupos, conversar e compartilhar referências com outros entusiastas de miniaturas fez com que estabelecesse relações que perduram por anos.


Além disso, o gosto pelas histórias é o que muitas vezes conquista o cliente. O sentimento de nostalgia é um grande aliado nas vendas das miniaturas: “Você acaba não levando apenas um carrinho, mas toda a história da sua vida que está embutida nele.” 


 As miniaturas ficam expostas na vitrine da banca. Crédito: arquivo pessoal 


E o impresso?


Segundo o comerciante, não há o que reclamar. Por mais que o cenário de vendas tenha mudado nos últimos anos, ainda tem muitos clientes que procuram pelas revistas, jornais e caça-palavras: “Tenho clientes que compram há mais de 20 anos. Alguns, hoje, não podem mais vir à banca, por uma questão de idade, de dificuldade de locomoção. Mas eu vou até a casa, levo, tomo um cafézinho, converso um pouco.”


Rogério em comemoração ao dia do jornaleiro. Crédito: arquivo pessoal


Outro público crescente é o de jovens em busca de HQs. O medo da dependência de telas leva muitos pais a irem com os filhos nas bancas em busca de histórias em quadrinhos, sejam elas as emocionantes de super-heróis, as mágicas dos mangás, ou as divertidas com os gibis da Turma da Mônica. 


E no país do futebol? Troca de figurinhas é gol na certa!


“Tenho orgulho de falar isso! Comecei com uma coisa bem amadora.” A banca de Rogério foi a primeira de Goiânia a trabalhar com troca de figurinhas. Tudo começou quando ele percebeu a decepção das pessoas que iam até lá, com os álbuns quase completos, mas não encontravam as figuras que faltavam. 


“Então eu abri 50 envelopes, organizei todas elas por ordem numérica. O pessoal chegava e eu falava: ‘Como está seu álbum? Quase cheio? Às vezes não compensa comprar o envelope. Tenho elas avulsas, um pouco mais caras, mas você pega a que você precisa e eu fico com as repetidas na base da troca de duas por uma”. Isso ocorreu em 2002 e fez tanto sucesso que, nos anos seguintes, Rogério passou a chamar reforços para atender a todos. A banca já chegou a atender 50 pessoas ao mesmo tempo em trocas de figurinhas. E, embora hoje a tecnologia ajude nesse processo, o jornaleiro reforça que tudo começou no boca-a-boca. 


O jornaleiro precisa contratar funcionários apenas para dar conta da demanda de figurinhas nos anos de Copa do Mundo. Crédito: arquivo pessoal

“Quero convidar vocês, para em 2026 virem aqui. Vão ver que vai estar a mesinha aqui do lado cheia de gente: avô, pai, filho…” Rogério ainda reforça o poder que a paixão do futebol tem de atravessar gerações. “Vinham crianças pequenas, que hoje já são pais. Os que já eram pais, hoje são avós.”









Comentários


bottom of page