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A Casa da Árvore e suas raízes

  • Foto do escritor: Gazeta Goyazes
    Gazeta Goyazes
  • 5 de ago. de 2024
  • 5 min de leitura

Atualizado: 7 de ago. de 2024

Conheça a história de uma das primeiras casas de Candomblé da região metropolitana de Goiânia e um pouco da religião em Goiás


Por Felipe Silva e Tiago Vechi



A espiritualidade em Goiás é muito mais ampla do que se imagina, para além das romarias de Trindade e das Marchas anuais para Jesus. Este também é um Estado das religiões de matriz africana.

As religiões de matriz africana e suas inúmeras expressões constituem a história deste Estado desde o seu surgimento, pois vieram junto dos povos escravizados trazidos para Goiás. Mais recentemente, os nordestinos que migraram e seus descendentes que aqui ficaram tiveram um papel importante para a consolidação dos espaços de manutenção dos saberes ancestrais.


Um exemplo é o Candomblé, que chegou oficialmente à Goiânia em 1970 pelas mãos do Pai João de Abuque. Ele montou sua primeira casa no setor Pedro Ludovico e contou, poucos meses antes de sua morte em 2006, durante o 3° encontro afro-goiano, que desde a primeira cerimônia teve que lidar com a polícia interrompendo o culto com soldados e fuzis.


A seguir, contamos a história da Casa da Árvore, fundada pela filha de João de Abuque em Aparecida de Goiânia, e como foi a experiência de visitar o espaço. Também falamos de intolerância religiosa e trazemos uma entrevista com a Yalasé Carol de Oxum.




O nascimento da Casa da Árvore


João de Abuque, filho do Orixá Oxóssi, fez centenas de filhos de santo, dentre eles está Tereza de Omolú, que fundou a Casa da Árvore, um terreiro de Candomblé em Aparecida de Goiânia, o primeiro da região, no Bairro Buriti Sereno. Hoje, já com idade avançada, ela continua sendo uma presença ativa no terreiro e participa de algumas práticas, mas a organização e a condução dos principais rituais ficam a cargo de seus dois filhos, Mário de Irôko e Carol de Oxum.


O curioso nome Casa da Árvore é uma referência ao Orixá Irôko, conhecido como o Orixá da árvore ancestral. Uma alusão ao princípio central do Candomblé que é a ancestralidade, simbolizada pela Gameleira, uma árvore também chamada de Irôko.



Vista de entrada da Casa da Árvore. Foto: Tiago Vechi



Para entender mais a história deste terreiro da segunda geração da casa de Candomblé, conversamos com Carol de Oxum, que nos conta que, com a morte de João de Abuque, houve uma ruptura entre as lideranças remanescentes nos terreiros, cada um seguiu seu caminho. Alguns permaneceram em Goiânia, enquanto outros foram para outros locais do Estado e até do Brasil.


Para além das rupturas, Carol também explica sobre a continuidade que há na religião aqui em Goiás e dá como exemplo a relação dela com os filhos de santo da sua mãe biológica. Ela conta que, desde a pandemia, Tereza de Omolú teve problemas de saúde e, agora, ela e seu irmão cuidam dos seus filhos de santo.


“Algumas pessoas eu coloquei a mão, claro  que com ela. Assim como meu irmão também, os filhos dele são iniciados aqui. A gente dá continuidade à história e aos filhos da minha mãe. A gente tem uma responsabilidade, é o nosso papel de sacerdote e sacerdotisa”.


Além disso, elas também continuam com os atendimentos e outros encaminhamentos da casa. 




A vista de um terreiro


Depois da reportagem contatar Carol de Oxum, fomos convidados para visitar a Casa da Árvore. Assim que se avista o portão da Casa da Árvore, é possível ver de um lado Obatalá, um Orixá guerreiro e vestido de branco e, de outro, Exu, um Orixá protetor e mensageiro. Aquelas pinturas simbolizam a proteção da casa.


Ao passar pela porta, o visitante fica cara a cara com uma estátua de Iemanjá, do lado direito há casas, cada uma dedicada a um Orixá ou entidade diferente. Ao lado esquerdo, tem o barracão onde são feitos os principais cultos e ao pé das escadas, uma estátua de Omolú, o Orixá da cura, com o rosto coberto de palhas.

 

No fundo, tem a casa da Yalorixá Tereza de Omolú, atrás dela há uma gameleira, também chamada de Irôko, e um espaço dedicado ao Orixá Xangô, o rei da Justiça.


A Yalasé Carol de Oxum, filha de Tereza, nos conta que a casa foi fundada em 1974. Ela explica que a construção de uma casa de Candomblé começa antes da construção, é necessário preparar o solo. 


Este processo começou quando Carol tinha apenas dois anos. Ela revela que, hoje em dia, eles são associados de uma casa na Bahia, dedicada ao Orixá Oxumarê.


Ela explica que mesmo seu irmão sendo filho do Orixá Irôko, a árvore ancestral, também chamado de Orixá do tempo, e ela de Oxum, Orixá da cachoeira do ouro e da beleza, ambos mantêm uma raiz comum no Orixá Oxumarê, a casa matriz na Bahia.


Além da matriz baiana, eles já contam com diversas raízes em Goiás, que nasceram deste terreiro. Atualmente, são centenas de pessoas que frequentam o terreiro regularmente. Carol também conta que todos os netos biológicos da sua mãe foram iniciados ainda na infância.




Intolerância religiosa


Questionada se eles lidam com ataques causados pela intolerância religiosa, Carol responde:


“O que acontece é que a gente foi o primeiro morador da rua. Então, a gente participou da construção, da formação do bairro, do desenvolvimento social do bairro, dos institutos públicos do bairro. Se era CMEI, se era UBS, a gente tinha essa discussão assídua. Por exemplo, sobre a necessidade de políticas públicas específicas para os povos de terreiro, porque nós somos uma diferenciação, a forma de organizar também é diferenciada, a gente precisa de políticas específicas para os povos de terreiro.”

Ela fala sobre um decreto que garante o dever do Estado de fornecer políticas públicas para povos de terreiro, assim como outros povos tradicionais. Carol declara que não basta combater o racismo e a intolerância religiosa, é necessário estabelecer uma saúde geral para os povos de terreiro.


Ela conta que muitas pessoas em vulnerabilidade de direitos procuram a ajuda do terreiro. Também traz relatos, por exemplo, de pessoas que vão ao hospital e o médico se recusa a tocar no corpo da pessoa por conta de indumentárias religiosas.


Carol também fala do racismo imposto aos negros que escancara ataques de intolerantes religiosos mais intensos contra pessoas não brancas. Há inclusive perseguições em escolas, em que crianças são proibidas de usar insígnias religiosas, ao passo que o mesmo não acontece com crianças cristãs.


“Eles obrigam a gente a ser padronizado com a forma que eles identificam as pessoas”, lamenta.


Carol diz que Goiás lida com questões específicas na intolerância devido ao contingente pequeno de pessoas que se declara como integrante dos povos de terreiro e que muitos direitos conquistados são escondidos, como o direito de se declarar como povo de terreiro no CadÚnico, por exemplo. 


Também fala sobre a questão da terra, que muitas vezes os terreiros precisam se mudar para áreas periféricas por conta da perseguição e ataques de intolerância, como dificuldades impostas no aluguel à invasão de terrenos.


Por fim, ela declara ser necessário reconhecer o patrimônio histórico dos povos de terreiro, para em seguida conquistar avanços em diversas áreas.


Conhecer um pouco mais desse patrimônio histórico e dos saberes ancestrais é um dos caminhos para se combater a intolerância. Nesse sentido, a seguir, você confere a entrevista feita com a Yalasé Carol de Oxum, onde ela conta um pouco sobre a historia de Obalauê:





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